Astrônomos da USP e UFRN identificam a primeira estrela gêmea do Sol rejuvenescida por efeito “botox estelar”

Astrônomos da USP e UFRN  identificam a primeira estrela gêmea do Sol rejuvenescida por efeito “botox estelar” e ajudam a desvendar o mistério de estrelas gêmeas solares pobres em berílio.






Equipe liderada por astrônomos brasileiros identificou uma estrela gêmea do Sol rejuvenescida por estrela companheira. Essa descoberta pode ajudar a desvendar o mistério de algumas estrelas similares ao Sol, mas que apresentam baixíssimo conteúdo de berílio. A pesquisa foi feita usando o telescópio VLT de 8 metros do Observatório Europeu do Sul (ESO).


A estrela estudada é a HIP 10725, uma das gêmeas solares observadas pelo astrônomo Jorge Meléndez em 2009 por meio do telescópio VLT. Meléndez, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, ficou intrigado com essa estrela devido à ausência do elemento químico berílio, que é proeminente no Sol e em outras estrelas gêmeas solares. A análise detalhada da HIP 10725 foi realizada recentemente no projeto de iniciação científica de Lucas Schirbel, estudante de Meléndez no curso de graduação em Astronomia do IAG/USP e autor principal do artigo que relata a descoberta.


Schirbel descobriu outras caraterísticas interessantes que ajudaram a entender a baixa quantidade de berílio na gêmea solar HIP 10725. A estrela apresentava um excesso de elementos pesados como o ítrio, bário, lantânio e neodímio. Esses elementos químicos não são produzidos em estrelas como o Sol, apenas nas de maior massa conhecidas como estrelas AGB. O grupo passou então a trabalhar com a hipótese de a gêmea solar ter sido contaminada por transferência desses elementos químicos vindos de uma estrela deste tipo.
Se de fato ocorreu transferência de material haveria uma consequência importante: a transferência de massa aumentaria a rotação da gêmea solar, ou seja, a HIP 10725 giraria mais rapidamente, parecendo mais jovem em relação à sua verdadeira idade. Isso foi conferido pelo grupo, que determinou que a estrela girava muito mais rápido do que deveria. A idade da HIP 10725 é de 5 bilhões de anos (similar à do Sol), porem a estrela tem uma rotação tão rápida quanto estrelas de apenas 1 bilhão de anos. O mistério da baixa abundância de berílio poderia ser explicado pela alta rotação, que aumentaria significativamente a destruição desse elemento químico.


As observações pareciam se encaixar, exceto pela ausência da estrela companheira AGB. Estrelas deste tipo são muito brilhantes e facilmente detectáveis, e não havia sinais da presença de uma estrela AGB próxima à HIP 10725. No entanto, essas estrelas também têm um período curto de vida. A transferência de massa poderia ter acontecido no passado, fazendo com que a estrela AGB perdesse seu envelope e deixasse para trás apenas o núcleo, que agora seria uma estrela muito compacta conhecida como anã branca. Anãs brancas têm pouquíssimo brilho, o que explicaria o fato de ela não ser visível próxima à HIP 10725.


A presença da anã branca poderia ser verificada pelo efeito gravitacional, pois causaria mudanças no movimento da HIP 10725. Observações adicionais, inclusive no Observatório Pico dos Dias, em Minas Gerais, indicaram que a HIP 10725 definitivamente tem uma estrela companheira “invisível”, resolvendo finalmente o mistério.


A descoberta exigiu muito trabalho de detetive por parte da equipe de astrônomos. “É muito satisfatório notar que uma anomalia, como a baixa abundância de berílio, pode redirecionar nossas pesquisas para descobertas inesperadas”, disse Lucas Schirbel.


O professor José-Dias do Nascimento e Matthieu Castro, ambos da UFRN, modelaram a transferência de material que aumentou a rotação da estrela e causou a destruição do berílio.  Estes pesquisadores batizaram o  fenômeno “efeito botox estelar, que causa o aparente rejuvenescimento da estrela devido ao aumento da rotação”, dizem os pesquisadores da UFRN.

Para o Professor Jorge Melendez, “outras quatro gêmeas solares com níveis baixos de berílio observadas por uma equipe japonesa em 2011, parecem ter companheiras anãs brancas, o que explicaria o mistério do seu baixo berílio”.


A equipe internacional inclui Lucas Schirbel, Jorge Melendez, Marcelo Tucci Maia (IAG/USP), Marcos A. Faria (Universidade Federal de Itajubá), Matthieu Castro,
José-Dias do Nascimento Jr. (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), Amanda I. Karakas, Martin Asplund, David Yong, Louise Howes (The Australian National University), Ivan Ramirez (University of Texas at Austin), e Maria Lugaro (Konkoly Observatory, Research Centre for Astronomy and Earth Sciences, Hungarian Academy of Sciences).


Contatos:
Jornalista Luciana Silveira, IAG/USP.

Prof. Dr. Jorge Melendez (IAG/USP), telefone (11) 30912840, e-mail jorge.melendez@iag.usp.br

 Lucas Schirbel (IAG/USP), e-mail: lucas.schirbel@usp.br

- Prof.  Dr. Jose-Dias do Nascimento, Jr. (UFRN), telefone (84) 9992 6288, email: dias@dfte.ufrn.br

O artigo completo foi aceito para publicação na revista Astronomy & Astrophysics, e pode ser lido em http://arxiv.org/abs/1510.01793



Representação artística de estrela AGB (esquerda) transferindo material para a gêmea solar. Figura adaptada por Irene Agnoletti e Jorge Meléndez do site http://www.antonine-education.co.uk/New_items/STA/G-Field/orbits.htm



Evolução do sistema duplo de estrelas, por Jorge Meléndez.
A. Há 5 bilhões de anos: Nascimento do sistema duplo. Estrela mais massiva (esquerda) é a progenitora da estrela AGB. Estrela gêmea solar (direita) tem menos massa e evolui mais lentamente.
B. Há 3 bilhões de anos. A estrela mais massiva evolui para a fase de estrela gigante AGB, transferindo material rico em elementos pesados para a gêmea solar.
C. Atualmente. Da estrela AGB resta apenas o núcleo, que é uma estrela anã branca.



Imagem da estrela gêmea solar HIP10725 (no centro) obtida do Digitized Sky Survey (https://archive.stsci.edu/cgi-bin/dss_form)




Lucas Schirbel, no Observatório do IAG/USP. Foto: Jorge Melendez






Prof. Dr. Jorge Meléndez (USP). Foto: Luciana Silveira.




Prof. Dr  José Dias do Nascimento (UFRN) Foto: AGECOM

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